Saudações, jogadores! Marco
Aurélio de novo e dessa vez venho falar de um assunto que muitas vezes não
recebe a devida atenção dos jogadores de MTG nas competições: os fatores
emocionais que envolvem o jogo. Cabe enfatizar que darei destaque às questões
que circundam o ambiente competitivo do MTG para ilustrar algumas situações que
comumente acontecem quando temos que lidar com grande pressão e tensão nos
torneios. O objetivo aqui não é passar um manual de instruções de como se
comportar durante um campeonato (isso realmente não funciona), mas trazer o
tema à tona para que todos nós possamos refletir acerca das atitudes
contraproducentes que atrapalham nosso desenvolvimento e evolução no Magic.
Acredito que esse artigo possa auxiliar tanto as pessoas que têm grandes
aspirações no Magic, como se classificar para um Pro Tour,por exemplo,
quanto àquelas
que têm objetivos menos pretensiosos, como conseguir evoluir como jogador e grindar na loja local. O texto foi
inspirado em uma série de artigos postados por Will Jonathan, um psicólogo do
esporte que escreve esporadicamente para a channelfireball. Esse é um artigo
opinativo – não tenho a intenção de postar verdades absolutas sobre o tema,
tampouco sou especialista no assunto. Sou psicólogo e curioso sobre essas
questões a minha intenção é traduzir as dicas do Will Jonathan à fim de trazer
as informações para a nossa realidade brasileira.
Quando você decide jogar
Magic competitivamente, você faz uma escolha. Você pode não estar completamente
consciente dessa escolha, mas ainda assim, você faz. A escolha é simples: você
decide passar pela experiência de ganhar ou perder – é parte do protocolo. Mas
não se engane: você não vai passar apenas por uma vertente dessa experiência.
Na verdade, vai acontecer de você passar por períodos de ganhos e perdas, e
isso acontece com todo mundo. Dito isso, é importante você saber lidar com as
vitórias e derrotas no Magic. Especialmente com o sentimento de derrota.
A
experiência de perder pode vir de diversas maneiras. Por exemplo, você pode
perder no meio da competição ou mesmo perder duas partidas consecutivas no
início de um torneio, abrindo um decepcionante 0-2. Pode haver situações de
você, em um torneio de 8 rodadas, começar ganhando 5 vezes consecutivas, perder
as outras 3 e ficar de fora dele. Enfim, o espectro de derrota no Magic pode
acometer o sujeito em diferentes ângulos. Conseguir superar esse sentimento e
seguir adiante é o que diferencia um jogador mentalmente forte de um jogador
que deixa a frustração soterrar completamente a possibilidade de aprender com
os erros cometidos e evoluir como player.
Acima de tudo, quando você
passar pela experiência de derrota, não se transforme em vítima. Quando as
coisas tendem a dar errado em um torneio, é natural que o seu foco fique tão
arraigado em quão ruins são as coisas no momento presente, que você perde todas
as perspectivas de vitória e imediatamente comece a sentir pena de você mesmo e
de sua situação atual. A melhor maneira de combater isso é o exercício de
autorreflexão e de controle dos pensamentos negativos que afloram nesse momento.
Muitas vezes encontramo-nos em uma “maré de azar” como costumamos dizer, que é
quando existe uma série de eventos onde você não é bem-sucedido. Esse tipo de perda
prolongada acontece com todos os jogadores, sem exceção. Até mesmo o mito Luis
Scott-Vargas,
jogador que ostenta a marca de 3 top 8 consecutivos em Pro Tours
(feito que nenhum outro jogador tinha conquistado) também teve seus períodos de
perdas prolongadas no passado, chegando a ficar por 4 anos sem nenhum resultado
significativo. Claro que o exemplo é muito distante da nossa realidade enquanto
jogadores que “tentam ser profissionais” jogando os PPTQs e eventualmente RPTQs
da região, mas ainda assim é válido para percebermos que até mesmo um dos
melhores entre os melhores também já passou por períodos de escassez de
resultados. Ou seja, você não está sozinho. Essa sensação de compreensão de que
você não está sozinho quando se trata de perder, poderá ajudá-lo a manter suas
más emoções em cheque, direcionando sua mentalidade na perspectiva certa.
Dessa maneira, é importante
que você mantenha o foco nas soluções, não nos problemas. Uma vez que você se
permite entrar nas emoções negativas de perder, seu foco se fixa puramente em
todos os problemas que você está tendo nesse momento presente. "Estou
jogando tão mal agora" ou "Eu continuo sem nenhuma sorte" ou
"Eu só escolho decks errados para cada torneio", são os pensamentos
incessantes que tendem a fazer você não enxergar o outro lado: a solução.
Lembre-se sempre que para cada problema, existe uma solução, e a solução é
muito mais importante do que o problema em si. Se você está jogando mal, não se
concentre no fato de que está jogando mal. Concentre-se na solução para não se
jogar tão mal e para começar a jogar como você é capaz de jogar. Se você
continua tendo azar em seus jogos, concentre-se na solução para esse fator, que
é aumentar a chance de você não precisar tanto dela, como é o caso de builds mais consistentes. Se você
continua escolhendo o deck incorreto para os torneios, se concentre no fato de
você está interpretando o metagame de
maneira errada, e pode fazê-lo de uma forma mais eficaz da próxima vez. Concentrar-se
apenas em problemas, geralmente tende a criar ainda mais problemas.
Concentrar-se em soluções faz com que você crie alternativas para chegar nessas
soluções.
Outro ponto relevante à
análise é o fato de que você não é determinado pelos acontecimentos do passado.
O que aconteceu nas primeiras rodadas de um torneio ou nos primeiros torneios
de uma temporada são irrelevantes. Aquele tempo se foi, e não há nada que você
possa fazer sobre isso, exceto aprender com seus erros e tentar diferente da
próxima vez. Não importa o quão bem-sucedido você tenha sido no passado, nem
quão mal você foi no último torneio, cada rodada é uma nova rodada. Deixe o
passado aonde ele pertence – seu passado não determina seu futuro. Além disso,
o inverso também procede; acredite: nem o passado do oponente realmente
importa. Quem nunca se sentiu intimidado ao estar enfrentando o “grinder da
região” ou algum player que você acha que é muito melhor que você? É uma reação
natural, mas se basear nisso faz com que você internalize que vai perder, não
importa o que aconteça.
Eu já vi muitos casos de ótimos jogadores que chegam no
torneio com uma moral tão arrasada, que acredita que não será capaz de vencer
nenhuma partida, já que nos últimos campeonatos tem se saído mal. A derrota,
nesses casos, acontece antes mesmo de se iniciar a partida.
No final, eu acredito que o
seu posicionamento e a sua saúde mental entre e durante os jogos, é o que faz a
diferença na hora do sucesso. Isso não quer dizer que a mente possa
substituir talento ou habilidade. Você pode ter a mente mais saudável e
resistente do mundo, mas se você não tem ideia de como jogar o jogo corretamente,
você não vai fazer resultados de forma consistente. Mas o contrário também é
verdade. Nenhuma quantidade de talento e habilidade podem substituir a força e
resistência mental. Você pode ser o melhor jogador do mundo em nível técnico,
mas se você tiver uma mente fraca, essa habilidade técnica não conta para nada.
Por quê? Porque é a mente que é responsável por executar essa habilidade
técnica e fazê-la funcionar.
Talvez tudo isso tenha algum
sentido para você. Talvez você seja um jogador que não consegue superar esse
impasse – e digo por experiência própria que é um processo árduo e que não
existem atalhos; ainda me vejo extremamente decepcionado por resultados negativos,
mas quem me conhece sabe que eu já fui muito pior nesse sentido. Talvez você
seja um grande jogador que tenha tido sucesso no passado, e que agora está
lutando para voltar ao nível no qual você já competiu. Ou talvez você seja um
jogador apenas começando a jogar competitivamente e que está interessado em
aprender. Não importa onde você reside nessa escala, o desenvolvimento da força
mental é sempre uma necessidade.
Nesse sentido, uma dica
valiosa é conseguir controlar seus próprios pensamentos. Quando um jogador
comete um grande erro durante um jogo e imediatamente fica chateado, essa é uma
reação inconsciente. Isso quer dizer que ele não formulou pensamentos
deliberados sobre o que acabou de acontecer, a reação de que ele fez uma
“burrada muito grande” acontece diretamente, sem que ele perceba o porquê de
ter essas sensações. A menos que você tenha controle consciente sobre seus
pensamentos, você nunca terá força mental real, pois sempre estará à mercê de
como sua mente decide usar essas coisas automaticamente, o que na maioria das
vezes não é bom. Mas isso é passível de
mudança, então quando cometer um erro durante um jogo, ou quando o oponente consegue
top deckar exatamente o que ele
precisa, é importante que você controle imediatamente seus pensamentos. O que
você pensa nesses momentos, e o que você diz a si mesmo, acabará por determinar
quais as decisões que você faz, as ações que você toma e as emoções que você
sente no futuro.
Vimos recentemente um exemplo real de uma
situação desse tipo. O campeão do Pro Tour Amonkhet, Gerry Thompson, fez um missplay na semifinal contra o japonês
Ken Yukuhiro, na câmera, diante de milhares de espectadores. Gerry resolve um
Grasp of Darkness em uma Winding Constrictor com dois marcadores +1 +1, ou seja,
uma criatura 4/5. Ao perceber o erro que culminou em sua derrota, Gerry possui
a força mental necessária para simplesmente esquecer o que acabou de acontecer
e seguir em frente. O resultado foi que Gerry virou esse match por 3 a1 e ainda
se sagrou campeão do Pro Tour. É claro que estamos falando de um jogador com
uma bagagem grande de eventos competitivos e que deve ter passado por um longo
processo até lidar com os erros de uma forma natural, porém, tomadas as devidas
proporções, semanalmente podemos observar situações semelhantes nos campeonatos
que disputamos. Pessoas que ficam tiltadas
porque fizeram a jogada errada e que não consegue retomar a um estado mental
saudável para prosseguir no torneio, paralisando em pensamentos negativos. É
por isso que o controle de pensamentos nocivos é tão importante na hora da
competição – é a diferença entre vencer ou perder. Mais do que isso: é a
diferença entre ficar estagnado por não conseguir lidar com um erro que
qualquer player está sujeito a cometer, e evoluir até o ponto de que isso é
superado com facilidade.
Para muitos jogadores, os
resultados são como um reflexo direto de si mesmos e de sua habilidade como
jogador. Se eles estão ganhando, significa que eles são ótimos jogadores e que
são realmente bons no jogo. Se eles estão perdendo, significa que eles estão se
tornando jogadores ruins que não têm o que é preciso. Esta é uma maneira efêmera
e destrutiva de abordar os resultados. A verdadeira força mental é poder manter
uma mente de nível elevado, independentemente de você estar ganhando ou
perdendo. Você nunca quer permitir que seus resultados determinem como você se
vê como jogador – sua autoimagem como jogador deve vir internamente. Caso contrário,
sua confiança e autoestima serão baseadas em um número, algo externo e sujeito
a alterações. Os resultados sempre devem significar nada mais do que uma fonte
de aprendizagem. Você está ganhando? Não importa. O que importa é descobrir o
porquê de você estar ganhando para que você possa continuar repetindo esse
processo sempre. Você está perdendo? E daí? O que importa é descobrir o porquê
de você estar perdendo para que você possa encontrar as soluções e aprender com
isso no futuro.
Treinar a mente é exatamente
como treinar o corpo. A força mental não é diferente da força física. Você vai
reagir mal a uma perda e ter vontade de bater em si mesmo quando fizer uma jogada
ruim. Isso é natural, afinal, você está tentando apagar anos de maus hábitos
mentais. Isso não acontece da noite para o dia. Quanto mais consistentemente
você trabalha em seu jogo mental, mais forte sua mente se tornará em um ritmo
mais rápido. Treinar a mente é um compromisso e, como qualquer compromisso,
leva trabalho, repetição e a vontade de ver ínfimos resultados através de
pequenas falhas e percalços ao longo do caminho.
Seu jogo mental faz a
diferença e pode te levar ao próximo nível como jogador. Espero que algumas
dessas informações tenham sido úteis para aprimorar sua experiência nas
competições de MTG e fazer você lidar melhor com suas emoções durante esse
processo.
Até a próxima! o/
Referências